quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Silvia filha sou eu. Silvia mãe é você. Silvia somos nós duas. 
A Silvia filha se sentia como se ela não estivesse mais naquela pele, pele que se renovava a cada dia, junto com a alma, pela pele. 
E o que isso importa? 
Tudo importa. Todos se importam.
A Silvia mãe estava lá, na cama do hospital e estava em todos os lugares, estava aqui em casa, estava no escritório, estava no fórum, no tribunal, estava em mim todos esses dias.
Silvia e a janela, a rua, um vestígio, um tempo...
Silvia filha vestida pela pele, pele marcada, pele sofrida, pele vestida de ciência, de cuidados, de orações, de nada, de saudade de Silvia mãe saudável tocando asa branca no acórdeon e naquela correria do dia a dia... 

Silvia filha não sabe rezar como a Silvia mãe, mas Silvia filha aprendeu com a Silvia mãe que reconhecer a beleza da vida é um jeito de rezar.  
Silvia filha vestida de medo adiantado do que ainda podia vir.
Silvia filha insegura, atravessando a porta e só querendo o mundo, e os lugares que queria ir na companhia de Silvia mãe algum dia...
Silvia e a imensidão.
Silvia e a volta, Silvia e a vinda, Silvia e a VIDA.
Silvia ainda...
Silvia estava no silêncio.
Silvia é Sílvia mesmo dormindo.
Silvia mãe é a voz. Sua voz em mim, apertando a minha mão como quem só queria dizer que ia ficar tudo bem... que ia dar tudo certo... A Silvia mãe sabe das coisas, ela sabe mesmo de todas as coisas...
Silvia mãe habita o coração de tantos... de todos que a conhecem e até daqueles que nem a conhecem, mas que já ouviram falar dela por ai...
Silvia omite, Silvia cala.
Silvia não é Silvia quando se cala.
Silvia filha, o disfarce, a melancolia, a tensão, o medo.
Silvia filha e a Silvia mãe que tudo habita.
Silvia e o corpo - complexo enigma.
Silvia filha e as lembranças lembradas, Silvia e o sufoco.
Silvia filha e a vida, Silvia filha e o medo da morte.
Silvia filha e o pai sentado na cabeceira da mesa com os olhinhos meio marejados por detrás dos óculos...
Silvia mãe e os olhinhos cansados, Silvia mãe e os sonhos.
Silvia filha não estava aqui quando acordava.
Silvia filha e a calma, ou Silvia e a urgência.
Silvia filha veloz, Silvia filha percorria as cidades, os países, os continentes, as nuvens...
Silvia filha, e as vontades que ficaram por dizer, Silvia filha e as atitudes que não tinha coragem de tomar...
Silvia filha e as dúvidas, o futuro incerto, e a opção pelo sim.
Silvia mãe, e a alegria, a alergia, Silvia filha sozinha com tanta gente por perto tendo que se ver com a própria questão.
Silvia filha e o medo da solidão.
Silvia mãe, o "x" da questão, a resposta certa para tantas dúvidas.
Silvia mãe estava aqui, estava no hospital e em todos os lugares.
Silvia mãe e a serenidade, Silvia filha e o grito mudo.
Silvia mãe e a força, a paciência.
Para a paciência, Silvia filha dedica a vida.
Silvia mãe está aqui! Silvia mãe e Silvia filha, as Silvias estão agora vestidas pela cura.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Penso tanto, que as vezes nem cabe na fala. 
A vida sempre me diz “Não vem tentar me controlar”, mas eu finjo que não escuto. Eu já sei, já entendi que o que ela quer de mim é coragem. E ai eu finjo que sou corajosa. E finjo tanto e tão bem, que ela bobinha até acredita.
O sofrimento se dilui
a dor se transforma em água que escorre pelos olhos
e o tempo trata de transforma-la em memória

O que parecia sólido cresce, se transformado em sólidão

E aquilo que havia se tornado líquido, não se perde por ai, vira memória na mente, cicatriz no corpo, calma na alma

O presente vira descoberta

É primavera,  e as flores que foram sementes outrora, agora caem sem nem avisar

E daqui a pouco, eu vou passar, catando as pétalas que se entornaram por ai

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Da janela

Da janela do carro, vejo várias vidas que fico imaginando como são... 
Invento pra elas nomes e acasos. O som do carro faz a trilha sonora dos filmes que crio na minha cabeça, com uma profusão de personagens... 

Da janela do quarto, entra em mim a ilusão da segurança, encontrando as portas abertas. Pela fresta entra um resto de medo e deixo que escapem alguns sonhos.

Do alto do prédio do escritório, minha janela se transforma num observatório de formigas. 



Da janelinha do avião, anseio pela aterrissagem enquanto atravesso o mar de algodão. 

Nos quadradinhos do trem, a velocidade pinta quadros da cor da paisagem.

Dos meus olhos, janela de mim, vejo um mundo só meu. De vez em quando encontro outras janelas que só veem a mim. Uma janela contempla a outra e dali podem surgir relatos, abraços e até algum convite. Curiosa sobre as outras janelas, as minhas janelas estão quase sempre enganadas.

Janela para a rua. Para a casa do vizinho. Para a alma de um amigo. Para emoldurar a vida.
Janela de criar. Câmera que não enquadra: os objetos é que escolhem como é que irão se enquadrar. 
Janela de sonhar. Ou de jogar os sonhos pela janela?

Mudo de paisagem constantemente, mas não me contento com nenhuma delas. No computador, abre-se a janela para um mundo sem fim. Um país de maravilhas que nos aprisiona angustiados como o coelho da Alice, sempre atrasado. Fecho o facebook, cansada, para finalmente enxergar a simples janela de abrir.

Da janela pra fora, desejo de liberdade. Da janela pra dentro, a história da alma.

As  janelas viram portas. Entro sem bater para ver o que há.

Observo a janela do outro, que me atiça a curiosidade. 

A vida é uma sequência de janelas e portas,  sonho e realidade.

Criar novas janelas, emoldurar outras cenas, colocar os sonhos em janelas. 

Para que essa vida, parede branca, tenha sempre novos quadros para serem contemplados.

Pedido ao Tempo

Tudo o que te peço, Tempo, é que me salve dessa entrega absurda de ir até o outro a ponto de me largar de mim. 
O que te peço, Tempo, é só o caminho do meio. 
É que me ensine a ter paciência para aprender e receber antes de me entregar. 
A ver além... 
A enxergar lá atrás do morro... 
Peço que me devolva a mim... 
Peço que eu saiba me reconhecer.
Que eu saiba cuidar somente daquilo que me pertença. 
E deixe ir... 
E deixe vir... 
Natural, inteira e leve...
Que a vida me encontre distraída, sem a ânsia de buscar aquilo que nem sei se quero, o que não vale, e o que não é. 
O que te peço, Tempo, é a aceitação do tempo e da vida como ela é. 
Sei que ela me espera inteira. 
Mostre a ela o caminho até mim. 
Enquanto isso, vou esperar em paz até que a verdade me alcance como num abraçaço bem forte. 
Tire de mim essa ânsia de ser feliz e inverta a ordem natural das coisas. 
Assopre no ouvido da felicidade a hora de me achar, sem volta. 
Que eu apenas contemple. 
E que eu consiga resistir à tentação de correr para o que ainda não está pronto pra mim. 
Que eu me apronte para a surpresa de um dia qualquer. 
Que eu acorde como quem nasce. 
Que seja assim... 
E que assim seja.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Eles ainda estavam deitados quando ela começou a chorar calada. Ele não viu, até porque ela jamais choraria na frente dele. As lágrimas escorriam devagar e silenciosas até atingirem o travesseiro. Ela teve o cuidado de sair do peito dele antes que o choro o molhasse.

Aquela tristeza estava presa na garganta já fazia tempo. Mas naquela noite ela se viu obrigada a libertar o que estava entalado. Os sentimentos não deixaram outra saída.

Ele estava falando algo, mas ela não conseguia prestar atenção. Estava mergulhada em outros pensamentos, na culpa que estar com ele a fazia sentir.

A verdade é que estar ali era humilhante. Bastava um comando dele e ela obedecia. Bastava uma mensagem e ela saía de qualquer lugar onde estivesse para encontrá-lo. Ela chegou a confundir com amor, mas era outra coisa. A carência a fez se apegar à ele e a fez acreditar que tinham algo bonito, ou que um dia pudesse vir a ter...

- Preciso ir. Ela disse.

- Mas já? Ainda é cedo.
- Tenho reunião amanhã de manhã... - mentiu.

Ele a acompanhou até a porta do carro e deu um beijo de despedida sem nenhum sentimento. Para ela, isso era o pior, o mais triste. O que a destruía, mas sempre a fazia voltar, na esperança de que, de repente, algo pudesse mudar. Mas não mudava.

Foi para casa... Queria dormir, mas só conseguia chorar o acúmulo de dor dos últimos tempos... Encharcou o travesseiro e deixou o rímel escorrer até não sobrar mais nada.

Foi ver que horas eram no celular e só então viu uma mensagem dele. "Eu adoro estar com você, mas hoje você parecia meio distante. Tá tudo bem? Espero que sim. Se cuida, linda".

 
Não queria se cuidar. Queria que ele a cuidasse. Queria aquele cuidado que não temos como oferecer a nós mesmos.

Desligou o celular e acabou esquecendo de ver o relógio. Não chorou mais.

 
O tempo passou...
 
E sabe que, ela lembrou dele e, quer saber? Não doeu nem um pouquinho.
O tempo passou. E ele também passou junto com o tempo. Ele virou só mais um rosto,  e o coração dela ficou leve. Ele o deixava pesado demais. Ele não aguentava mais, apesar de querer. E como foi bom ele ter, finalmente, entendido que não precisava mais de carrega-lo como um fardo.

Na verdade, o coração sentiu a falta dele todo os dias, todas as noites. O vazio que ficou no lugar dele era imenso. Porém, necessário. Foi difícil ficar sem saber dele, dos seus dias, do que ele iria fazer no final de semana.


O coração sofreu com a saudade. Sofreu por mais um tempo, não ia mentir. E então, passado tudo isso, de repente ele parou de sentir. Se acostumou com a ausência dele  até que o vazio parou de incomodar.
Como tudo na vida, ele também passou. Como aquele medo de fantasmas que um dia fica para trás.

A indiferença veio como um anjo da guarda para trazer a paz que ela tanto precisava. E, graças a ela, não saber dele se tornou natural. Assim como ela não sabia se existia vida em outros planetas. Não é algo que tirava o sono dela, que perturbava...

Era só mais uma pergunta que, para ser bem sincera, ela nem fazia questão de saber...

Não saber como ele está, na verdade, não importa mais.

O que ela sabia hoje, era só dela. 

 
E ela estava bem.

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

AINDA BEM QUE EU TENHO SETE VIDAS


Rasgue a venda

Estava tudo bem. 
Eram aqueles pensamentos fora de órbita que vez ou outra tentavam perturba-la.
Da sua força, só ela sabia.
Hoje ela se olhou no espelho como se fosse a primeira vez e esqueceu todos os defeitos que certa vez tinha se atribuido. 

Deixou pra lá todos os conceitos que tinha de sí. 
Foi bom se permitir esse encontro. 
Os olhos dela estavam vendados. 

Então rasgue essa porra dessa venda! Não posso fazer isso por você. Não posso entrar na sua cabeça e te fazer perceber que o que você pensa tá tudo errado. 

Acho que, lá no fundo, ela sabia disso. Só não conseguia acreditar.
A verdade, é que ela não era perfeita e nem precisava ser. 
Cair, errar, normal. Aceita que nem sempre você vai acertar. 
E aprenda a enxergar que isso não quer dizer que você não é boa o suficiente. 
Isso é apenas a vida sendo vivida. 

A falha dela não era falta de amor. Era o excesso dele. 

A falta de sentimento está nos outros e, por mais que seja bom o que você tem a oferecer, as pessoas tem a opção de negá-lo. 
Paciência. 
Não é culpa sua (dá pra por isso na sua cabeça, de uma vez por todas?).

Ela se vestia de luz. E isso é tão raro nos dias de hoje. 

Ela foi lá pra fora, olhou pro céu e viu que o pior já passou. 

E ficou tudo bem!

segunda-feira, 19 de agosto de 2013



Solta que volta

O coração às vezes aperta. 
E eu um sinto medo daquele vazio. 
Eu entendo que seja melhor ir. 
Por algum motivo que sei que não entendo, sei que o melhor a fazer é ir. 
É precisa ir, porque a vida é curta, então vai, pode ir sem medo. 
Medo, sim, às vezes sinto medo. 
Meu tempo não foi perdido, meu tempo é só meu, e não estou aqui à toa.
Mas você falou pra eu vir e eu vim.
Vim atrás de algo tão maior que apego. 
Tão maior que medo. 
Ninguém é dono de ninguém. 
E se estamos aqui hoje é pela escolha. 
Pelo querer . 
Pelo que é nosso.
Só quero que seja leve. 
E acima de. nós, só luz

domingo, 12 de maio de 2013

Deu um gole na água e saiu por aí a caminhar sem esperar nada.
Já fazia muito tempo que não se sentia assim. 
De alguma forma ia trombando com as vontades e com os acontecimentos como alguém que tromba com algo esquecido no fundo do armário, ou na poeira de uma lembrança antiga. Tinha afeição por coisas velhas e via os amigos como se todos fizessem parte de um espetáculo, com tramas e dramas tão reais que chegavam a ser inacreditáveis. E tudo parecia muito natural. Sentia, que algumas coisas estavam dando muito certo. Havia conquistado uma espécie de segurança e de uma paz interior que não entendia bem se tinha sido conquistada com análise ou com deus. Tinha a paz de quem vive o instante presente. Vivendo sem querer mais que o desenrolar das coisas possam dar. Havia aprendido a focar sua energia. Ou talvez estivesse simplesmente feliz por ser capaz de ser uma pessoa. E ser uma pessoa era tudo o que queria ser, sem promessas para o futuro, mas na certeza de habitar com toda a força a preciosidade do momento presente. Não queria vender loucuras pro mundo, mas somente conservar o melhor lado de sua loucura. 
Como quem quisesse apenas colocar as vontades nos seus lugares certos.
Sobre o tamanho de incerteza que me leva ao lugar mais incerto.
Sobre a certeza inerte.
Sobre a vontade de viver mais do que posso, de experimentar um pouco de tudo e de ter sempre aquela sensação de ter feito pouco.
Sobre o resto, aprendi nada.
Me recuso a querer ser equilibrada demais, não sou obrigada. 
Mas sinto falta do equilíbrio, as vezes.
Às vezes o vazio é só fome. Ou sede. Ou vontade de criar problemas.
Sei que a minha inquietude de hoje tem a ver com aquele pânico de me tornar uma dessas pessoas que simplesmente tiram o lixo da casa, levam o cachorro pra passear....
Vivo constantemente sobre o paradigma da urgência.
Querer que cada instante seja único me faz ser tomada pela ansiedade.
E assim vou passando por cima das coisas... Tropeçando nas pessoas... Tropeçando em mim. 
Não posso querer ser mais do que não fui.
Assim como querer ser mais é apenas a tentativa de querer ser alguma coisa. 
Não sei se sou alguma coisa. Mas as vezes me pego tentando. E tentar ser pode valer mais do que se colocar em um lugar de estabilidade.
Eu sou aquilo que não prometo ser e a cada minuto que passa vou me desconstruindo nesse risco enorme que é a vida.

terça-feira, 9 de abril de 2013

Já é março. 
O verão começa a dar as costas pro tempo e dá lugar pro outono, pras folhas que caem das árvores. 
A minha alma habita um instante essencial que parece voltar àquilo que nunca foi mas sempre quis ser. É quando me dou conta de que é preciso muito cuidado para cuidar daquilo que se chama vida. 
A casa é o corpo, o tempo é a calma. 
Eu não me canso nunca, tô  sempre ai pronta pro acaso. 
Melhor acreditar.
Melhor ser. 
A ternura como força revolucionária. 
A paciência com o desenrolar dos acontecimentos. 
Respiro profundamente e olho no fundo dos olhos dos meses do ano. 
Só queria estar aonde estou agora, estar aonde se está. 
Mudar quando for preciso. 
E rir.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

"E eu não sabia que minha história
era mais bonita que a de Robinson Crusoé."

Carlos Drummond de Andrade - Infância